Desde que a quarentena começou, muito se tem falado sobre os cuidados com a saúde mental em meio ao isolamento social. Em uma rápida pesquisa no Google defrontaremos com vários artigos relacionados ao tema, com inúmeras sugestões de atividades para manter a saúde mental neste período. Mas ficam as questões: Pensando que cada sujeito está vivendo suas angústias de uma maneira, quais dicas são realmente eficazes? A generalização de “faça isso” ou “aquilo”, realmente ajuda?
Ao nosso ver, uma experiência individual, não serve como referência para a solução de um problema coletivo.
Para pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social, que em sua maioria têm como fonte de renda trabalhos informais – como no caso das profissionais que atuam no contexto da prostituição – e/ou estão em busca de colocação no mercado de trabalho, a pandemia e a demora na liberação do auxílio emergencial do Governo Federal, podem causar problemas como: a fome, o aumento da violência doméstica, o acúmulo de contas para pagar, dentre outras emergências. Tais problemas e emergências, podem desencadear sintomas como: insônia, ansiedade, depressão, síndrome do pânico. Pensando dentro desta realidade, recomendações como “evite o uso de aparelhos eletrônicos ou café à noite”, são incapazes de solucionar as questões concretas e tem pouca eficácia para minimizar o sofrimento.
O que queremos dizer é que um cuidado deve ser tomado antes de dar as tão preciosas dicas e recomendações, para não cairmos em generalizações.
Concordamos que algumas recomendações, como: tente manter uma rotina, evite notícias sensacionalistas, tome cuidado com as fake news, procure manter contato virtual e/ou telefônico com pessoas queridas, tente distrair assistindo um filme, uma série, ouvindo uma música são válidas. No entanto, entendemos que essas recomendações não devem ser levadas como soluções para as angústias que a COVID-19 pode desencadear.
Precisamos lembrar que o momento de instabilidade mundial, a mudança radical na rotina e o isolamento social e, para alguns, a impossibilidade de cumprir o isolamento recomendado, podem provocar sensações de: insegurança, incerteza, tristeza, tédio e cansaço mental. Em certa medida, todos estamos tendo que lidar com esses sentimentos e sensações, e não há nada de errado nisso, estranho seria não se sentir afetado por esses acontecimentos.
Para as mulheres atendidas pelo Projeto Antonia não é diferente, algumas delas nos trazem relatos como:
“É muito cruel, estou num mato sem cachorro, eu não sei o que vou fazer, sinceramente”;
“As coisas não estão muito boas, não, porque eu não paguei meu aluguel esse mês e estou com uma conta de água sem pagar”;
“O aluguel mesmo eu só vou poder pagar quando cair esse dinheiro” (auxílio emergencial);
“Eu estou bem, mas dei o último pingo para os bebês agora”.
Reforçamos aqui que, caso os sentimentos e sensações venham a tomar uma proporção que beira o insuportável, mesmo procurando manter uma rotina, evitando notícias sensacionalistas e outras recomendações, a “dica” é procurar atendimento profissional.
Pensando nestes fatores, uma parceria do Projeto Antonia com o Núcleo de Estudos e Trabalhos Terapêuticos – NETT, oferece atendimento psicológico/psiquiátrico por telefone ou vídeo chamadas para as mulheres assistidas, que sentirem necessidade.
Para a população em geral, que não é assistida pelo projeto Antonia, trazemos como sugestão alguns coletivos e instituições: o EscutAto – Instituto de Psicologia da USP (contato: [email protected]), e o “Varandas Terapêuticas” no “Instituto Gerar” (contato: tel. (11) 3032-6905 e (11) 97338-3974), que também estão oferecendo atendimento de escuta gratuito, mediante agendamento, para pessoas que apresentem sintomas psicológicos devido a pandemia.
Texto: Reine Rodrigues de Oliveira
Foto: SerenaWong/Pixabay